segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Frei Betto:

Dez conselhos para viver a religião:

1. Religue-se. Evite o solipsismo, o individualismo, a solidão nefasta. Religue-se ao mais profundo de si mesmo, lá onde se cultivam os bens infinitos; à natureza, da qual somos todos expressão e consciência; ao próximo, de quem inevitavelmente dependemos; a Deus, que nos ama incondicionalmente. Isto é religião, re-ligar.

2. Tenha presente que as religiões surgiram na história da humanidade há cerca de oito mil anos. A espiritualidade, porém, é tão antiga quanto a própria humanidade. Ela é o fundamento de toda religião, assim como o amor em relação à família. Busque na sua religião aprimorar a sua espiritualidade. Desconfie de religião que não cultiva a espiritualidade e prioriza dogmas, preceitos, mandamentos, hierarquias e leis.

3. Verifique se a sua religião está centrada no dom maior de Deus: a vida. Religião centrada na autoridade, na doutrina, na ideia de pecado, na predestinação, é ópio do povo. “Vim para que todos tenham vida e vida em abundância”, disse Jesus (João 10,10). Portanto, a religião não pode manter-se indiferente a tudo que impede ou ameaça a vida: opressão, exclusão, submissão, discriminação, desqualificação de quem não abraça o mesmo credo.

4. Engaje-se numa comunidade religiosa comprometida com o aprimoramento da espiritualidade. Religião é comunhão. E imprima à sua comunidade caráter social: combate à miséria; solidariedade aos pobres e injustiçados; defesa intransigente da vida; denúncia das estruturas de morte; anúncio de um “outro mundo possível”, mais justo e livre, onde todos possam viver com dignidade e felicidade.

5. Interiorize sua experiência religiosa. Transforme o seu crer no seu fazer. Reduza a contradição entre a sua oração e a sua ação. Faça pelos outros o que gostaria que fizessem por você. Ame assim como Deus nos ama: incondicionalmente.

6. Ore. Religião sem oração é cardápio sem alimento. Reserve um momento de seu dia para encontrar-se com Deus no mais íntimo de si mesmo. Medite. Deixe o Espírito divino lapidar o seu espírito, desatar os seus nós interiores, dilatar sua capacidade amorosa.

7. Seja tolerante com as outras religiões, assim como gostaria que fossem com a sua. Livre-se de qualquer tendência fundamentalista de quem se julga dono da verdade e melhor intérprete da vontade de Deus. Procure dialogar com aqueles que manifestam crenças diferentes da sua. Quem ama não é intolerante.

8. Lembre-se: Deus não tem religião. Nós é que, ao institucionalizar diferentes experiências espirituais, criamos as religiões. Todas elas estão inseridas neste mundo em que vivemos e mantêm com ele uma intrínseca interrelação. Toda religião desempenha, na sociedade em que se insere, um papel político, seja legitimando injustiças, ao se manter indiferente a elas, seja ao denunciá-las profeticamente em nome do princípio de que somos todos filhos e filhas de Deus. Portanto, temos o direito de fazer da humanidade uma família.

9. A árvore se conhece pelos frutos. Avalie se a sua religião é amorosa ou excludente, semeadora de bênçãos ou arauto do inferno, serva do projeto de Deus na história humana ou do poder do dinheiro.

10. Deus é amor. Religião que não conduz ao amor não é coisa de Deus. Mais importante que ter fé, abraçar uma religião, frequentar templos, é amar. “Ainda que eu tivesse fé capaz de transportar montanhas, se não tivesse o amor isso de nada me serviria”, disse o apóstolo Paulo (1 Coríntios 13, 2). Mais vale um ateu que ama que um crente que odeia, discrimina e oprime. O amor é a raiz e o fruto de toda verdadeira religião; e a experiência de Deus, de toda autêntica fé.

* Escritor

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Rua
Procuro a rua
que ainda me resta:
É longa, é alta,
não é essa.
Esqueço o nome,
por sono ou pressa:
é alta, é clara,
mas não é esta.
Em cada esquina
havia uma festa:
é clara, é vasta,
não é essa.
Nunca me lembro
onde começa:
é vasta, é longa,
mas não é esta.
Rua que não
se manifesta:
é longa, é alta,
não é essa.
Cecília Meireles

domingo, 24 de outubro de 2010

Que mistério tem Clarice...

Benjamim Moser, o jovem biógrafo americano de Clarice Lispector, vai estar aqui em Porto Alegre, autografando seu livro CLARICE, na Feira do Livro.

Minha amiga Áurea me deu o livro de presente no iníco do ano e não desgrudei o olho da leitura, do início ao fim. Relembrei a intensidade que ler Clarice Lispector sempre teve para mim desde o primeiro contato que tive com sua obra.

Me lembro do impacto que tive quando, aos 17 anos, li Perto do Coração Selvagem. Chegou a mim via uma colega do Colegial, que me emprestou pra que eu lesse e pudesse comentar com ela certas passagens que ela não sabia se tinha entendido... E assim ficamos imersas naquela literatura impressionante, que continha uma verdade muito além da nossa compreensão do momento, mas que a gente pressentia, e por isso se encantava.

Eu queria decifrar a Clarice, compreender aquele mistério da alma humana, aquela profundidade que ela conseguia tocar. Vieram os outros livros, Felicidade Clandestina, A Paixão segundo GH... especialmente esses dois: não fui a mesma depois de tê-los lido.

"Escrevi livros que fizeram muitas pessoas me amar de longe", ela disse. Assim foi.

A biografia escrita pelo Benjamin Moser é maravilhosa. Acrescenta muitos fatos novos e importantes ao que já se sabia de Clarice Lispector. Essa entrevista dele é bem interessante e também o documentário com a última entrevista dela, poucos dias antes de morrer. Vale a pena.



sábado, 23 de outubro de 2010

É preciso não esquecer nada


É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.

É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.

O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.

O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.

O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos conosco, pois o resto não nos pertence.

Cecília Meireles

domingo, 25 de julho de 2010

Karlfried Graf Durckheim


É a sua rara síntese de psicoterapia (C.G. Jung), sabedoria oriental (Zen Budismo) e Cristandade (Meister Eckhart) que resulta numa expressão única, inconfundível. Grande terapeuta, influência decisiva na vida e no ensinamento de Jean-Yves Léloup, segundo ele próprio.

Veja o belo video com Durckheim abaixo.

“Cada um dos dilemas fundamentais da vida vem marcado com seu próprio poder salvador. Cada angústia recorrente, cada anseio e esperança encontrarão seu devido auxílio e auxiliar. O mestre é um desses auxiliares.”

“Desde sempre, arrastadas pelo desespero, as pessoas são levadas a buscar o conselho e a ajuda que sua própria natureza verdadeira pede. Elas mesmas constroem os ajudantes que precisam, simplesmente porque estão sofrendo e buscando tão intensamente. Elas recebem a resposta ou orientação cheia de maestria a partir de outros que, em si mesmos, de forma alguma são mestres.”

“Se olharmos para o Ser como a única realidade e para nós mesmos como prisioneiros do mundo, então a única maneira de nos realizarmos plenamente e de retornar à realidade última será deixar esse mundo completamente para trás, morrer, e assim entrar finalmente na realidade do Ser que é o Todo e que é Um.”

“Mas, se olharmos a Vida como algo que transcende a antítese Ser Supremo versus realidade mundana, e encararmos a manifestação do Absoluto no mundano como sendo o nosso real objetivo, então vamos poder realizar-nos plenamente, testemunhando-O na nossa maneira de viver, aprender e agir no mundo.”


sábado, 27 de março de 2010

Milonga de Los Morenos, Borges, Ramil, Caetano...

.
Alta la voz y animosa
como si cantara flor,
hoy, caballeros, le canto
a la gente de color.
.
Marfil negro los llamaban
los ingleses y holandeses
que aquí los desembarcaron
al cabo de largos meses.
.
En el barrio de Retiro
hubo mercado de esclavos;
de buena disposición
y muchos salieron bravos.
.
De su tierra de leones
se olvidaron como niños
y aquí los aquerenciaron
la costumbre y los cariños.
.
Cuando la patria nació
una mañana de Mayo,
el gaucho sólo sabía
hacer la guerra a caballo.
.
Alguien pensó que los negros
no eran ni zurdos ni ajenos
y se formó el Regimiento
de Pardos y de Morenos.
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El sufrido regimiento
que llevó el número seis
y del que dijo Ascasubi:
"Más bravo que gallo inglés".
.
Y así fue que en la otra banda esa morenada, al grito de Soler,
atropelló en la carga del Cerrito.
Martín Fierro mató a un negro y es casi como si hubiera
matado a todos. Sé de uno que murió por la bandera.
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De tarde en tarde en el Sur
me mira un rostro moreno,
trabajado por los años
y a la vez triste y sereno.
.
¿A qué cielo de tambores
y siestas largas se han ido?
Se los ha llevado el tiempo,
el tiempo, que es el olvido.


sábado, 20 de fevereiro de 2010

A Felicidade...


Neste vídeo muito interessante, Matthieu Ricard, monge budista que já foi considerado "a pessoa mais feliz do mundo"(!?) dá as últimas sobre Felicidade. (Dá pra assistir com legendas em Português, é só selecionar):


terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Genial:



Elizabeth Gilbert nasceu no Connecticut em 1969. Com quase trinta anos, tinha tudo o que qualquer mulher poderia querer: um marido apaixonado, uma casa espaçosa que acabara de comprar, o projeto de ter filhos e uma carreira de sucesso. Mas, em vez de sentir-se feliz e realizada, sentia-se confusa, triste e em pânico. Enfrentou um divórcio, uma depressão debilitante e outro amor fracassado. Até que decidiu tomar uma decisão radical: livrou-se de todos os bens materiais, demitiu-se do emprego, e partiu para uma viagem de um ano pelo mundo – sozinha. Foi aí que escreveu o livro "Comer, Rezar e Amar".

Neste vídeo, ela fala sobre as coisas impossíveis que esperamos de gênios e artistas, e compartilha uma idéia radical: no lugar de "ser" um gênio, todos nós "temos" um gênio... Uma palestra engraçada, pessoal e supreendemente emocionante.

Pinçado do site da Casa de Teatro de Porto Alegre